terça-feira, 16 de junho de 2009

O velho boteco do seu Zé


Existiu uma vez em Santa Maria uma casa que era o ponto de encontro de roqueiros, amigos e viciados em café escocês. Era o boteco do seu Zé. Durante meses foi o melhor lugar para se ir na cidade. Unificando gerações na noite. Infelizmente o sucesso subiu para cabeça do seu Zé, o bar fechou e com ele se foram lembranças e as mágoas do fim.




Tinha um boteco perto da antiga rodoviária, onde tinham acabado de inaugurar uma grande boate de música eletrônica. Então esse boteco ficou super segmentado, e exigente. Só ia galera com grana e fãs do Rock n' Roll. Foram meses de muita badalação. Seu Zé era o nome do dono do boteco. O seu Zé era gaitero e nas madrugadas de baixo quorum ele ia para o palco com sua gaita e mandava ver nos Bob Dylan. Lembro que todos os amigos da faculdade iam para o boteco do seu Zé. Galera que curtia o som de lá. No começo o seu Zé ia na porta das nossas salas no campus para convidar a gente para fazer um som. Nessa época era tão bom ir lá que eu me atrevia a batucar nas costas de um violão sem braço. A energia do boteco era tão boa que até as minhas batucadas faziam sucesso. Mas nem tudo permaneceu assim.

O seu Zé ganhou uma grana legal nos primeiros meses do boteco, enquanto a "playboyzada" ia na "Maison Club" para ouvir os barulhos que os dejotas faziam. A "elite cultural" ia para o boteco. Com todo o sucesso, o seu Zé foi reformando o boteco, deixou maior, comprou equipamentos novos, contratou técnico de áudio e principalmente reformou o palco.

O palco do boteco era muito elitista. Todo feito em mármore e granito, com detalhes em cobre e ouro. Não era qualquer um que podia subir ali. Foi então que a galera começou a ficar chateada com seu Zé. Aqueles que antes iam lá tocar por prazer e curtir com o seu Zé, não mais podiam. Os bateristas nem podiam tirar a camisa quando tocavam Fuel. E ele ficava criticando as bandas, dizia que tinham que aprender a tocar para poder subir no palco novo do boteco. O engraçado que antes quando o seu Zé precisava divulgar o boteco valia tudo, até violão desplugado. O pessoal tocava lá de graça, e nem uma ceva o seu Zé dava para os amigos (não se sabia mais se ainda eram amigos). Então um dia o seu Zé começou a fazer uma coisa muito chata. Chamava os guris da faculdade para tocar na sexta feira. Dava um latinha de ceva para cada um deles. Resultado: O boteco lotava de gente, porque era a essência do rock que estava sendo executada no boteco. O problema que no sábado o seu Zé sempre chamava bandas de fora como Porto Alegre, Caxias e até de Curitiba para tocar. E essas bandas só se apresentavam no boteco com cachê pago. Foi então que nós começamos a pensar e perceber. O seu Zé faturava grana com as apresentações dos amigos que ele não gastava nada; para poder pagar as bandas de fora.
Nós tinhamos um amigo que era uma mistura de argentino com roqueiro britânico, excelente guitarrista e fumante compulsivo. Era craque em tocar Amigo Punk e qualquer canção dos Cascavelletes. Um dia ele tocou no boteco e junto com ele uma menina que agente não conhecia direito. Os dois fizeram um cover muito massa de Iggy Pop. A música era Candy e a tal menina fez a parte da Kate Pierson. Nós achamos do c*** a apresentação dos dois. A essência do rock, bem o que a gente curtia. Eis que perguntaram para o seu Zé o que ele achara. Para surpresa de todos ele disse "que o 'Hermano' até que era mais ou menos, mas a menina ia ter que aprender a tocar e cantar para subir no palco do bar dele". O espanto foi geral, o Hermano tocava no boteco de graça e bem ainda, a menina agradou a todos. O seu Zé além de chato foi muito mal educado.
O seu Zé ficava cada vez mais chato. Outra vez comentamos que iriamos fazer uns cartazes para divulgar que ia ter show da galera da faculdade no boteco. Eis que o seu Zé negou dizendo "capaz, para as bandinhas daqui de SM eu não faço cartaz". Nos colocou no chão.

Com toda essa mudança do seu Zé, que antes era um amigão agora passara a ser um interesseiro. As bandas resolveram não tocar mais no boteco do seu Zé. Não a menos que fossem pagos com um cachê justo. E sem as bandas, saíram do boteco os fãs das bandas e todos aqueles que curtiam o Rock n' Roll.

Não levaram muitos meses e o seu Zé teve que fechar o boteco. Não teve mais público e não pode mais pagar as contas. Tudo por causa do excesso de ganância. E isso é tão fatal que fechou um boteco famoso numa cidade como Santa Maria que na época tinham mais de duzentos mil habitantes. Ouvi dizer que seu Zé pipocou de cidade em cidade tentando obter o mesmo sucesso que teve com o boteco na frente da antiga rodoviária. Mas aparentemente sua iniciativa não obteve sorte.

Eram bons os tempos de noitadas no boteco do seu Zé. Sigo na esperança de encontrar lugares tão legais quanto o o boteco daquela época. De preferência sem a ganância do velho Zé.

10 comentários:

Nutshell disse...

(y)
Era o que eu tinha vontade de gritar aos quatro ventos.

Gustavo Minuzzi disse...

Seu Zé fez escola!

Gustavo Minuzzi disse...

Outra coisa: Meus parabéns pelo texto!

Eveline Poncio disse...

ótimo texto Arnaldo!

=D

Ander disse...

bxando o nível

Carol disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Carol disse...

ótimo texto, e que história triste a do seu zé....
mas tá no rock é pra se fuder mesmo.

sabe "corista de rock", da rita lee? pois é. a música tem cheiro de naftalina, mas a letra faz bastante sentido.

Unknown disse...

Bah cara q saudade do tempo do boteco, esses dias fui comer um mortal nao xis da Louerdes, faltou vc lembrar desse detalhes, o xis mortal depois do boteco na Lourdes!!!
hehehehe

Unknown disse...

Eres un rocker?
Com estan.. era muito massa o som que faziamos lá né... o meuzinho q achaste da porra co caralho do diploma.. fudeu pô..

mas

Adiante a lucharmos!
Abraçao, saudações cruzeirenses arnaldo!

Gustavo Minuzzi disse...

Passou todo esse tempo, e na verdade o texto é mais verdadeiro ainda.